Postado por: Marcos Abrucio
Agora que já varremos a última rua da Vila Madalena e o último argentino dormindo no sambódromo já foi para casa (a pé), podemos respirar fundo e desabafar: ufa, #tevecopa.
Podemos até dizer, olha só, que a esperança venceu o medo. Mas não foi fácil, não.
Antes da Copa, o medo era de que a indignação coletiva contra os gastos do evento e, principalmente, a nuvem de mau humor estacionada sobre o país nos impedisse de aproveitar a época mais legal que existe.
Se a indignação era (e é) justa, deixar de curtir a Copa seria imperdoável. Por isso, tentei lembrar por que a detestável Copa do Mundo era tão apaixonante. E que era possível ser critico à organização do Mundial e, ao mesmo tempo, se emocionar com ele.
No fundo, acreditava que quando a bola rolasse, conseguiríamos separar as coisas. Mais que uma certeza, era uma esperança – que, no fim das contas, estava certa: as nuvens se dissiparam, os memes se espalharam, os jogos ajudaram, a Copa pegou e o bicho, não.
Resultado: nossos netos vão ficar de saco cheio de nos ouvir falar como foi incrível curtir uma Copa tão de pertinho. Bom, pelo menos pra mim, foi.
***
A cada quatro anos, sempre tento viver a Copa. E viver a Copa é muito mais do que assistir aos jogos. É:
( ) Assistir aos jogos, ( ) ler sobre eles no jornal e na internet, ( ) assistir às mesas redondas depois deles, ( ) discutir sobre eles no café, ( ) escrever umas pataquadas sobre eles aqui nas internets, ( ) colecionar o álbum de figurinhas, ( ) trocar figurinhas repetidas, ( ) decorar a casa, ( ) vestir uma camisa amarela, ( ) dar pelo menos uma sopradinha na vuvuzela, ( ) xingar o Galvão.
Mas para viver uma Copa dentro da nossa casa, fazer tudo isso ainda era pouco, muito pouco. Era preciso também:
( ) Ver pelo menos um jogo ao vivo, ( ) viajar pelo Brasil pra sentir o clima da Copa em outras cidades, ( ) interagir com gringos de toda parte querendo saber onde fica o bar da esquina da sua casa, ( ) juntar copos daquela famosa cervejaria, ( ) ver o melhor jogador do mundo bem de perto, ( ) só falar disso o dia inteiro, ( ) ficar às raias da demissão.
Hmmm, deixa eu ver. É, tiquei todos os itens.
***
E o legal é que não vivemos uma Copa qualquer. Para muitos, especialistas e não-especialistas, brasileiros e gringos, empolgados e realistas, essa foi a melhor dos últimos tempos.
De fato: vimos times buscando a vitória o tempo todo, muita velocidade, trocas de passes precisas, viradas emocionantes, enfim, o extremo oposto do Brasileirão. Com tudo isso, até jogos que tinham tudo para ser sofríveis viraram jogões, como Argélia x Coreia e Grécia x Costa Rica.
A inglesa Four-Four-Two, uma das revistas de futebol mais importantes do mundo, fez um ranking dos melhores jogos da Copa no Brasil. Eu vi de perto cinco dessas partidas.
Aí vão elas, em ordem crescente de qualidade, segundo o ranking dos caras, com algumas breves observações de quem esteve lá:
5) Bélgica 1 x 0 Coreia, 26/06/2014, 17h, Itaquerã, ops, Arena Corinthians (61o. no ranking)
Os belgas bêbados e empolgados eram divertidos, os coreanos, coitados, até tentaram torcer, o Biro-Biro estava na porta do estádio, mas pra mim, o que vai ficar desse jogo é que na Copa do Mundo, até jogo ruim é legal.
4) Argentina 0 (1) x 0 (0) Suíça, 01/07/2014, 13h, Arena São Pa, ops, Arena Corinthians (45o. no ranking)
Lá estava eu, no meio da torcida argentina, suando muito. Não, não era medo de apanhar ao eventualmente ser pego torcendo pelos suíços – o problema era o sol da hora do almoço rachando o nosso coco. Boa, FIFA. O jogo foi tenso e truncado até o fim da prorrogação, quando Messi passou por três e achou Di Maria em um lance de gênio (ou de Ronaldinho Gaúcho – logo, de gênio). Ainda deu tempo para a Suíça meter uma bola na trave e quase matar do coração todos à minha volta.
3) Colômbia 2 x 0 Uruguai, 28/06/2014, 17h, Maracanã (27o. no ranking)
Mais cedo naquele dia, o Brasil jogava contra o Chile. Estávamos em Botafogo, roendo as unhas em frente à TV. O jogo foi para a prorrogação, e a gente roendo os dedos. O jogo foi para os pênaltis, não acabava nunca… Só acabou quando já estávamos roendo os cotovelos e faltava uma hora para atravessarmos a cidade e chegarmos ao Maraca. Nunca corri tanto na minha vida. Botamos o pé no estádio junto com o pontapé inicial. Sentei aliviado no meio dos colombianos, com câimbra até no suvaco. A recompensa: vimos o maior golaço do campeonato e gritamos RÂMES! RÂMES! com a galera no estádio mais bonito do mundo.
2) Inglaterra 1 x 2 Uruguai, 19/06/2014, 16h, ZL Stadiu, ops, Arena Corinthians (23o. no ranking)
Já escrevi bastante sobre esse jogo aqui. Foi meu primeiro jogo de Copa do Mundo, então vai ter sempre um lugarzinho especial no coração. Não dá pra esquecer o show de Luis Suárez nem a tristeza dos torcedores ingleses. Deve ser horrível ver do estádio o seu país ser desclassificado, né?
1) Brasil 1 x 7 Alemanha, 08/07/2014, 17h, Mineirão (1o. no ranking)
É, é horrível ver do estádio o seu país ser desclassificado. Segundo a lista da FourFourTwo, foi o jogo mais memorável desta e talvez de TODAS as Copas. Da minha parte, concordo: não vou esquecer aquela tarde tão cedo. Mas como já escrevi antes, foi uma derrota mais vergonhosa do que traumática. Por conta do país e do nosso futebol hoje serem diferentes, os 7 a 1 não serão tão lamentados como foi o Maracanazzo ou a tragédia de Sarriá. Sei lá, é o que eu acho. Ou talvez eu esteja apenas querendo economizar na conta do psicólogo.
***
Só sei que a sova alemã não vai, de forma alguma, apagar da nossa memória a Copa incrível que tivemos por aqui. Por fim, mais duas conclusões que esses dois meses só consolidaram em minha mente:
1) Não existe palco melhor para uma Copa do Mundo do que aqui.
2) A Copa no Brasil foi a melhor coisa que aconteceu em muito, muito tempo. Para a Copa e para o Brasil.