Arquivo da categoria: Copa 2014

O campeonato é longo

As derrotas de Donald Trump nos EUA (ainda não admitida!) e da maioria dos candidatos apoiados por Bolsonaro nas eleições municipais no Brasil (ainda a serem confirmadas em segundo turno!) equivalem aos 3 a 0 da seleção sobre a Espanha na final da Copa das Confederações em 2013.

Lembra? Foi demais, foi incrível, lavamos a alma, resgatamos nosso orgulho, reconquistamos o respeito mundial, ôôôô, o campeão voltôôôô.

Aí, um ano depois, levamos 7 a 1 da Alemanha.

Entre os dois jogos, ficamos celebrando a nossa volta por cima e endeusando um esquadrão que aparentemente só precisava da camisa amarela para ser imbatível. Ah, e não evoluímos um centímetro na preparação para o que realmente importava: a Copa. Por outro lado, os adversários, pelo menos os alemães, estudaram direitinho como segurar nossos Neymars, Bernards, Hulks e Freds.

Bom, estamos a dois anos do que realmente importa: a eleição para presidente em 2022. Depois de uma longa série invicta, as forças do mal parecem (parecem!) ter levado uma goleada nos pleitos de agora. É óbvio que os Darth Vaders da política vão tentar voltar com força total no próximo. Vão estudar as fraquezas da nossa defesa, vão tentar acabar com a reputação dos nossos craques, vão tentar nos impor mais um 7 a 1.

Não é hora descuidar, portanto. Temos que trabalhar para evoluir o nosso jogo. Melhorar nossa estratégia. Ficar de olho nos nomes que poderão ser convocados. E ficar atentos em todas as bolas alçadas na área. Ou em 2022 vai virar passeio. De novo.

Não quero nem saber

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— Pai, uma amiguinha da escola me deu umas figurinhas de uns homens

Olívia tem 3 anos e meio e, para meu alivio financeiro, ainda não conhece o álbum da Copa.

— Filha, são as figurinhas da Copa do Mundo!

— Eu não sei o que é a Copa do Mundo.

Oras, que espécie de pai sou eu? Como não apresento à minha filha o ápice da aventura humana na Terra? Mas essa é a minha deixa. A oportunidade perfeita para contar a ela o que faz desses próximos dias a época mais incrível de todas.

— Oli, a Copa é o campeonato de futebol mais legal do mundo, com times de muitos países jogand…

Ela me interrompe.

— Pai! Eu não quero saber o que é a Copa do Mundo.

Olívia tem 3 anos e meio e, para meu profundo desgosto, não quer nem saber o que é a Copa do Mundo.

***

Isso foi há algumas semanas, e ainda estou me recuperando do mini-infarto que sofri naquele dia. Pensei em deserdá-la, mas depois lembrei: ela não está sozinha. Pela primeira vez, a maioria dos brasileiros não tem interesse pela Copa. Pela primeira vez, eu sou minoria.

Bom, nos últimos quatro anos não faltaram motivos para isso. Ainda mais depois de 2014 — com tudo o que a Copa no Brasil teve de bom e de ruim. De bom: foi a Copa que a gente viu de perto, pô! Vivemos um mês respirando futebol o tempo todo, nas conversas, nas ruas, na mídia. E aí rolou uma overdose, claro. De ruim: levamos a maior de todas as traulitadas, tão grande que virou piada.

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Mas teve mais: de lá para cá o ex-manto da seleção virou o uniforme de uma facção política com uma ideia muito clara: derrubar quem estava no poder. O resultado — um país muito pior depois disso — faz com que as pessoas agora tenham vergonha de usar a camisa do Brasil até trancadas sozinhas no quarto.

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A torcida brasileira sempre foi mais exigente (= chata) do que apaixonada pela seleção. Só que agora o país está é de bode dessa coisa toda. Acho que depois do primeiro jogo, tudo isso muda. Em todo caso, vou me esforçar para fazer a minha parte.

***

— Filha, essa vai ser a sua primeira Copa! Não é legal? Na outra, você estava na barriga da mamãe.

— É?

— É, e você se comportou direitinho. A mamãe, com aquele barrigão, assistia a todos os jogos do meu lado no sofá. E dormia em todos…

Como se vê, Olívia puxou da mãe o apreço pelo futebol. Eu continuo:

— Só teve um jogo que foi complicado. Eu estava no estádio vendo o Brasil, a mamãe ficou em casa. O Brasil foi levando gols lá e ela aqui foi ficando sem ar, sem ar, parou até no hospital. Nada a ver com o jogo, ela não liga muito, acho que foi bronquite. Mas deu tudo certo. Com vocês duas, né, porque o Brasil, mesmo, levou sete.

Por sorte, Olívia não estava mais me ouvindo. Estava ocupada botando as bonecas para dormir no sofá.

***

A estreia da Olívia em Copas me lembrou de outras estreias. O primeiro jogo de Mundial que eu vi na TV: Brasil x Espanha em 86. Gol de Sócrates, eu pulando no sofá da casa minha avó, o juiz roubando os espanhóis num gol claro que só ele não viu:

Em 2002, a estreia do Brasil na Copa teve outra roubalheira a nosso favor. Viramos o jogo contra a Turquia num pênalti totalmente inventado: o juiz marcou uma falta no Luizão que nem existiu — e cujo lance foi fora da área.

Estreia do Brasil em 2006. Jogo contra a Croácia. Tínhamos uma seleção sensacional, com a maior quantidade de craques por metro quadrado em campo desde 1982. Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Kaká, Adriano, Roberto Carlos. Cafu, Robinho (ok, nem todos eram craques). O time tinha ganho tudo (e ainda dado baile) no ano anterior. Quando chegaram na Alemanha, os jogadores estavam todos gordos e anestesiados. Era como se o país inteiro tivesse ficado sóbrio de uma hora para outra e os jogadores ainda estivessem bêbados. Um negócio assustador de se ver.

2014: a minha estreia in loco em jogos de Copas. Uruguai x Inglaterra no Itaquerão. Não teve preço a emoção de ver um jogo de Mundial na casa do meu time. Não teve preço pegar um trem pra ZL conversando com hooligans. Não teve preço saber que o mundo inteiro estava olhando para onde eu estava. Aliás, não teve preço mesmo: ganhei o ingresso da minha cunhada, à qual agradeço até hoje: valeu, Dani!

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***

Tite tem dois grandes desafios neste ano: o primeiro é recuperar a autoestima de uma equipe que levou 10 gols nos últimos dois jogos de Copa. Paradoxalmente, o outro é conter a euforia de uma equipe que, sob o seu comando, voltou a ganhar e a jogar bem. Boa sorte, professor.

Mas muito maior é o meu desafio: fazer a Olívia curtir a Copa. Ou pelo menos, curtir 1% do que eu curto. Já vai ser muito.

Posso me ver no próximo domingo, dia de Brasil x Suíça:

— Filha, vamos ver o jogo do Brasil?

— …

— Eu te pago um sorvete depois. De morango.

— Vamos!

Canarinho-Pistola

Postado por: Marcos Abrucio

O Despertar pra Copa*

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Dia frio e seco de outono em São Paulo. Um homem de quase 40 anos desperta do sono, com uma leve dor de cabeça e um mal-estar pelo corpo. Tem aquela sensação de quem dormiu além da conta. Olha em volta e percebe que está em um quarto de hospital. Assim que tenta se levantar – sem sucesso, diga-se de passagem – uma enfermeira se aproxima da cama. Parece espantada por vê-lo acordado e sai pela porta dizendo que vai chamar um médico. Logo ele nota o rosto de um velho conhecido a seu lado no quarto.

– Pô, quem diria que você acordaria bem no dia em que eu tivesse um tempinho pra te fazer uma visita…

– Como assim…?

– Ah, faz tempo que eu tava pensando em dar uma passada, mas o trampo na agência…

– Não, não… Quero dizer, “como assim, acordar…?”

O amigo puxa a cadeira para perto da cama e sua expressão, antes de leveza e alegria, fica pesada e séria.

– Cara, você não lembra? Faz 4 anos que você tá assim…

– Assim como?

– De cama… Sem acordar…

– Eu tava em coma?

– Mais ou menos… Bom, os médicos nunca conseguiram diagnosticar exatamente o que você teve…

– Não entendi. O que aconteceu? Foi acidente?

– É, dá pra dizer que foi… Não gosto nem de lembrar.

– Fala logo ou vou ter um piripaque!

– Outro piripaque não! Espera o médico chegar. Vai que você não pode reviver o que causou o trauma.

– Trauma? É, pode ser…

– Vamos mudar de assunto.

– Tá, tá… Até porque esse papo já tá me dando mais dor de cabeça. Pô, 4 anos, né? Deve ter mudado muita coisa…

– Pois é…

O homem se ajeita na cama enquanto o amigo vai lhe contando as novidades.

– E minha família?

– Todos bem, inclusive a sua sobrinha de 3 anos.

– Eu tenho uma sobrinha de 3 anos?! Caraca! Como ela é? Tem foto pra eu ver?

– Segura a ansiedade que ela tá vindo aí com sua família. Já mandei uma mensagem pra eles.

– Ah, boa. Que baita novidade. O que mais rolou?

– Tanta coisa… Nem sei por onde começar.

– A gente tinha um blog para falar da Copa, né?

– Pois é, tô escrevendo semana sim e outra também pra manter nosso blog ativo.

– Tá no ar ainda? Boa. E a seleção? A última coisa que lembro é que tava aos trancos e barrancos na Copa…

– Mudou muito de lá pra cá. Do que mais você lembra?

– Deixa eu ver… Thiago Silva capitão, o gol contra do Marcelo, o Neymar se contundindo…

– Tem muita gente nova no time, mas o Thiago e o Marcelo tão aí até hoje. E o Neymar foi confirmado com a 10 depois de se recuperar da contusão.

– Nossa, ele ainda tava se recuperando da entrada do Zuñiga?

– Não, tava em tratamento de outra contusão… Aliás, daquele time, o Dani Alves e o Fred tão fora de ação, contundidos.

– Dani Alves seguir na seleção, ok. Mas o Fred “cone”?

– Cara, quanto rancor. O Fred até recuperou o faro de gol depois da Copa.

– Difícil de acreditar… Ele ainda é o camisa 9?

– Não, o 9 é o Gabriel Jesus. E o reserva do ataque é o Firmino.

– Jesus? Firmino?

– Os dois surgiram depois da Copa de 2014 e tão entre os 23 convocados pelo Tite pra Copa na Rússia.

– Ah, o Tite assumiu a seleção depois de 2014. Demorou!

– Demorou mesmo porque quem assumiu depois da Copa foi o Dunga. O Tite só veio em 2016.

– Dunga de novo?! É sério? Não faz sentido algum.

– Desencana de tentar entender. E aí, mais alguma lembrança vem à cabeça?

– Bom, o Brasil tava na semi contra a Alemanha, com Bernard e sem Neymar. Me dava até um desespero…

– Vai com calma aí.

– Peraí, agora eu tô lembrando: o Brasil tava perdendo de lavada! E no primeiro tempo!

– Olha o monitor cardíaco bipando: você tá ficando agitado. E cadê o tal médico que tava vindo? Enfermeira!

– Tá bom, tá bom. Mas me conta o que aconteceu. Tem a ver com meu trauma?

– Então… Você entrou em choque quando o Brasil tomou o terceiro gol e não conseguiu mais ver o resto do jogo. Na verdade, nenhum de nós conseguiu. A gente chamou a ambulância e veio pro hospital com você.

– Que trauma. A Alemanha foi pra final então?

– Sim, os alemães pegaram os hermanos na decisão.

– Argentina finalista?! Com aquele time? Só o Messi se salvava. Deve ter sido outra lavada…

– Pior que não. Teve grande chance de ganhar. O Higuaín perdeu um gol feito quando tava zero a zero. Na prorrogação, a Alemanha fez 1 a 0 e levou o caneco.

– Quem diria, o time que nos massacrou contra a nossa maior rival na final. A torcida deve ter ficado dividida.

– Na verdade, os brasileiros torceram em massa pelos alemães. Nossos vizinhos ficaram bem chateados com isso.

– Os Almeida ficaram chateados?

– Não, os meus vizinhos… Os nossos vizinhos: os argentinos.

– Ah, entendi. Mas depois daquela goleada na semi, dá pra entender por que os hermanos esperavam apoio da nossa torcida.

– Com certeza. Mas a rivalidade falou mais alto.

– Eu não sei o que faria. Acho que não conseguiria torcer pelo time que acabou com nosso sonho do Hexa.

– Foi difícil mesmo.

– Pô, torcer pros “culpados” pela nossa maior derrota em uma Copa jogando em casa…

– É, o Maracanazzo já não detém mais esse título.

– Fora a humilhação de levar 3 a 0 em pleno Mineirão…

– Ih, azedou… Você ainda acha que o jogo acabou 3 a 0? Peraí, que agora eu preciso ter certeza de que alguém tá vindo pra te medicar… Enfermeeeeeira!

*História baseada em fatos bem reais e outros nem tanto pra marcar a volta ao blog após 4 anos.

Postado por: Flavio Tamashiro

Há um ano

Postado por: Marcos Abrucio

Sejamos francos (sempre quis começar um texto assim, com “sejamos francos”; legal, gostei): na maioria dos dias, não acontece nada.

Nada de realmente importante, quero dizer. Tudo bem, de vez em quando rola “Curtindo a Vida Adoidado” na Sessão da Tarde. Mas fora isso, é o mesmo trânsito de sempre, uma ou outra discussão no Congresso, mais um golaço do Messi. Nenhuma novidade.

No entanto, existem alguns dias em que tudo acontece. 11 de junho do ano passado foi um deles.

Foram tantas coisas legais juntas que fica difícil dizer qual foi a mais incrível. Vejamos (sempre quis botar um “vejamos” no meio de um texto…):

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Para começar, 11 de junho de 2014 foi o meu aniversário. O dia mais legal que existe — pelo menos para quem faz aniversário nesse dia, no caso eu, o Hugh Laurie, o Gene Wilder e, droga, o J.Hawilla.

No seu aniversário, o universo inteiro o trata como você e a sua autoestima gostariam de ser tratados todos os dias. Naquelas 24 horas, você é o cara.

Fale por você. Eu sou cara todo dia.

Fale por você. Eu sou o cara todo dia.

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Mas beleza, aniversário tem todo ano. Ontem mesmo rolou um deles, valeu, galera! Mas 11 de junho do ano passado foi também a véspera das minhas férias.

E todo mundo que já foi à escola sabe o que isso significa: é o dia mais cheio de esperanças, expectativas e empolgação do ano todo. Todas as obrigações estão às suas costas. À sua frente, só alegria. O despertador some da sua vida e você experimenta a inigualável sensação de não ter a menor ideia de que dia da semana é hoje. É demais.

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Tá legal, férias também tem todo ano (cara, espero do fundo do meu coração que você tenha férias todo ano), mas 11 de junho do ano passado também foi o dia da véspera da Copa do Mundo. E aí vamos para outro patamar de coisa legal.

Big Itaquera Stadium, one year ago.

Big Itaquera Stadium, one year ago.

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Como esse espaço (não muito frequentado ultimamente, é verdade) sempre repete: a época da Copa é a mais legal de todas. Ela começa quando o Brasil se classifica para o Mundial (sempre, por favor) e vai até o zelador do estádio da final apagar os refletores.

Mas o auge é mesmo no mês em que o mundo inteiro para para ver os jogos mais fantásticos que existem (ok, menos Nigéria x Irã).

E lembremos todos (“lembremos todos” também é legal, hein?) que esta não foi uma Copa qualquer, e sim a Copa das Copas.

Não foi (só) papo da Dilma. Torcedores, jogadores, jornalistas de todo o mundo consideraram a Copa do Brasil uma das melhores de todos os tempos. Jogões, golaços, viradas emocionantes, prorrogações… Para quem gosta de futebol, a nossa Copa teve de tudo (clique aqui, vale a pena).

Gracias!

Gracias!

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Só que, há um ano, nem todo mundo estava empolgado com isso. O rescaldo das manifestações de 2013 ainda pairava sobre a Copa. O mau-humor era generalizado. Olha só a capa da Folha no dia da abertura da Copa:

30 dias depois, essa manchete seria o contrário.

30 dias depois, essa manchete estaria invertida.

Ok, havia motivos para o pé atrás: o gasto exagerado em estádios que poderiam virar elefantes brancos (e, surpresa!, viraram) era uma preocupação mais do que válida. Sim, podíamos ter feito uma Copa mais brasileira. Com menos gastos, desconfianças, roubalheiras. Sim, a FIFA é abominável — e que bom que seus líderes fétidos começaram a cair.

Mas eu acreditava que dava para ser crítico à organização do Mundial e, ao mesmo tempo, curtir a melhor época que existe. No fim, foi o que rolou: quem não tinha ingresso deu um jeito de comprar, os estádios lotaram, os gringos vieram para se divertir, a gente se divertiu com eles, a Vila Madalena virou a ONU (e mictório, também) compramos toneladas de figurinhas e todos gritamos a plenos pulmões: OEAAAAA!

Foi tão legal que nem a maior derrota de todos os tempos foi capaz de tirar o gosto bom que essa Copa nos deixou.

***

A expectativa pela Copa teria tudo para ser a coisa mais bacana daquele 11 de junho. Mas…

Mas em 11 de junho do ano passado eu fiquei sabendo que aquele voluminho na barriga da minha mulher não era um voluminho qualquer. Era uma menininha.

E não era uma menininha qualquer, e sim a menininha das menininhas: Olívia!

Sorry, Copa, mas não dá para competir com isso:

Falemos a verdade!

Falemos a verdade!

Eu nem imaginava, mas há um ano verdadeiramente começava a época mais legal de todas…

A Copa que eu vi(vi)

Postado por: Marcos Abrucio 

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Agora que já varremos a última rua da Vila Madalena e o último argentino dormindo no sambódromo já foi para casa (a pé), podemos respirar fundo e desabafar: ufa, #tevecopa.

Podemos até dizer, olha só, que a esperança venceu o medo. Mas não foi fácil, não.

Antes da Copa, o medo era de que a indignação coletiva contra os gastos do evento e, principalmente, a nuvem de mau humor estacionada sobre o país nos impedisse de aproveitar a época mais legal que existe.

Se a indignação era (e é) justa, deixar de curtir a Copa seria imperdoável. Por isso, tentei lembrar por que a detestável Copa do Mundo era tão apaixonante. E que era possível ser critico à organização do Mundial e, ao mesmo tempo, se emocionar com ele.

No fundo, acreditava que quando a bola rolasse, conseguiríamos separar as coisas. Mais que uma certeza, era uma esperança – que, no fim das contas, estava certa: as nuvens se dissiparam, os memes se espalharam, os jogos ajudaram, a Copa pegou e o bicho, não.

Resultado: nossos netos vão ficar de saco cheio de nos ouvir falar como foi incrível curtir uma Copa tão de pertinho. Bom, pelo menos pra mim, foi.

DIreto do camarote

DIreto do camarote

***

A cada quatro anos, sempre tento viver a Copa. E viver a Copa é muito mais do que assistir aos jogos. É:

( ) Assistir aos jogos, ( ) ler sobre eles no jornal e na internet, ( ) assistir às mesas redondas depois deles, ( ) discutir sobre eles no café, ( ) escrever umas pataquadas sobre eles aqui nas internets, ( ) colecionar o álbum de figurinhas, ( ) trocar figurinhas repetidas, ( ) decorar a casa, ( ) vestir uma camisa amarela, ( ) dar pelo menos uma sopradinha na vuvuzela, ( ) xingar o Galvão.

Mas para viver uma Copa dentro da nossa casa, fazer tudo isso ainda era pouco, muito pouco. Era preciso também:

( ) Ver pelo menos um jogo ao vivo, ( ) viajar pelo Brasil pra sentir o clima da Copa em outras cidades, ( ) interagir com gringos de toda parte querendo saber onde fica o bar da esquina da sua casa, ( ) juntar copos daquela famosa cervejaria, ( ) ver o melhor jogador do mundo bem de perto, ( ) só falar disso o dia inteiro, ( ) ficar às raias da demissão.

Hmmm, deixa eu ver. É, tiquei todos os itens.

***

E o legal é que não vivemos uma Copa qualquer. Para muitos, especialistas e não-especialistas, brasileiros e gringos, empolgados e realistas, essa foi a melhor dos últimos tempos.

De fato: vimos times buscando a vitória o tempo todo, muita velocidade, trocas de passes precisas, viradas emocionantes, enfim, o extremo oposto do Brasileirão. Com tudo isso, até jogos que tinham tudo para ser sofríveis viraram jogões, como Argélia x Coreia e Grécia x Costa Rica.

A inglesa Four-Four-Two, uma das revistas de futebol mais importantes do mundo, fez um ranking dos melhores jogos da Copa no Brasil. Eu vi de perto cinco dessas partidas.

Aí vão elas, em ordem crescente de qualidade, segundo o ranking dos caras, com algumas breves observações de quem esteve lá:

5) Bélgica 1 x 0 Coreia, 26/06/2014, 17h, Itaquerã, ops, Arena Corinthians (61o. no ranking)

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Os belgas bêbados e empolgados eram divertidos, os coreanos, coitados, até tentaram torcer, o Biro-Biro estava na porta do estádio, mas pra mim, o que vai ficar desse jogo é que na Copa do Mundo, até jogo ruim é legal.

4) Argentina 0 (1) x 0 (0) Suíça, 01/07/2014, 13h, Arena São Pa, ops, Arena Corinthians (45o. no ranking)

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Lá estava eu, no meio da torcida argentina, suando muito. Não, não era medo de apanhar ao eventualmente ser pego torcendo pelos suíços – o problema era o sol da hora do almoço rachando o nosso coco. Boa, FIFA. O jogo foi tenso e truncado até o fim da prorrogação, quando Messi passou por três e achou Di Maria em um lance de gênio (ou de Ronaldinho Gaúcho – logo, de gênio). Ainda deu tempo para a Suíça meter uma bola na trave e quase matar do coração todos à minha volta.

3) Colômbia 2 x 0 Uruguai, 28/06/2014, 17h, Maracanã (27o. no ranking)

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Mais cedo naquele dia, o Brasil jogava contra o Chile. Estávamos em Botafogo, roendo as unhas em frente à TV. O jogo foi para a prorrogação, e a gente roendo os dedos. O jogo foi para os pênaltis, não acabava nunca… Só acabou quando já estávamos roendo os cotovelos e faltava uma hora para atravessarmos a cidade e chegarmos ao Maraca. Nunca corri tanto na minha vida. Botamos o pé no estádio junto com o pontapé inicial. Sentei aliviado no meio dos colombianos, com câimbra até no suvaco. A recompensa: vimos o maior golaço do campeonato e gritamos RÂMES! RÂMES! com a galera no estádio mais bonito do mundo.

2) Inglaterra 1 x 2 Uruguai, 19/06/2014, 16h, ZL Stadiu, ops, Arena Corinthians (23o. no ranking)

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Já escrevi bastante sobre esse jogo aqui. Foi meu primeiro jogo de Copa do Mundo, então vai ter sempre um lugarzinho especial no coração. Não dá pra esquecer o show de Luis Suárez nem a tristeza dos torcedores ingleses. Deve ser horrível ver do estádio o seu país ser desclassificado, né?

1) Brasil 1 x 7 Alemanha, 08/07/2014, 17h, Mineirão (1o. no ranking)

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É, é horrível ver do estádio o seu país ser desclassificado. Segundo a lista da FourFourTwo, foi o jogo mais memorável desta e talvez de TODAS as Copas. Da minha parte, concordo: não vou esquecer aquela tarde tão cedo. Mas como já escrevi antes, foi uma derrota mais vergonhosa do que traumática. Por conta do país e do nosso futebol hoje serem diferentes, os 7 a 1 não serão tão lamentados como foi o Maracanazzo ou a tragédia de Sarriá. Sei lá, é o que eu acho. Ou talvez eu esteja apenas querendo economizar na conta do psicólogo.

***

Só sei que a sova alemã não vai, de forma alguma, apagar da nossa memória a Copa incrível que tivemos por aqui. Por fim, mais duas conclusões que esses dois meses só consolidaram em minha mente:

1) Não existe palco melhor para uma Copa do Mundo do que aqui.

2) A Copa no Brasil foi a melhor coisa que aconteceu em muito, muito tempo. Para a Copa e para o Brasil.

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