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Os Caniggias

Postado por: Marcos Abrucio

Se o Brasil não ganhou TODAS as edições da Copa do Mundo, a culpa é deles. Dos algozes, dos carrascos, dos verdugos do Brasil. Dos Caniggias.

Para quem não lembra ou estava no maternal na época: Caniggia foi o cara que, com sua pose de vocalista do Poison, recebeu uma bola açucarada de Maradona, driblou Taffarel e defenestrou a seleção do Lazaroni em 1990:

Giggia, Paolo Rossi, Cruyff, Zidane (duas vezes) também nos entubaram em Copas do Mundo. Mas foram ótimos jogadores, dos maiores de todos os tempos. O fato de terem esmigalhado o Brasil foi apenas um de seus muitos feitos.

Já Claudio Caniggia, não. Quando se fala nele, a gente só se lembra daquela tarde em Turim. Do ponto final de uma das piores campanhas brasileiras de todos os tempos. (Tudo bem, vai. A gente também lembra dessa foto.)

Pois bem, quem foram nossos Caniggias? Pra começar, um dos nossos maiores executores, o…

1) Chuveirinho Assassino

Talvez você não tenha reparado, mas nas últimas três Copas que o Brasil perdeu (2010, 2006 e 1998), fomos derrubados por gols de bola parada.

Pausa para a sessão nostalgia-masoquista. 1998 e o “Quem é que sobe?!”:

2006 e o “Sai, Dida!”:

2010 e o “Fica, Júlio Cesar!”:

Dureza. Mas tão perigoso quanto a sanguinária bola aérea é o…

2) Já-ganhou dos Infernos

Claro que o Uruguai tinha um grande time. Mas o diabólico clima de “já-ganhou” criado nos dias que antecederam a final de 1950 foi determinante para a derrota brasileira.

Não por culpa dos jogadores, que fique claro. Um jornal carioca botou em letras garrafais, em cima da foto da seleção: “Eis os Campeões Mundiais” – ANTES do jogo. Políticos não saiam da concentração. Mendes de Morais, então prefeito do Rio, exigiu a vitória em discurso inflamado no Maracanã: “Eu cumpri minha palavra construindo esse estádio, cumpram agora seu dever vencendo a Copa do Mundo.

Com tanto peso nos ombros, não podia dar certo.

Claro que a Holanda de Cruyff era melhor que o Brasil em 1974. Se os dois times jogassem mais duzentas vezes, talvez empatássemos uma ou duas e olhe lá. Mas que o Brasil menosprezou aquele time, ah, menosprezou. Não é, Zagallo?

Além desses dois, também fomos vítimas de outro Caniggia: o…

3) Destino Vil e Cruel

Só o Destino Vil e Cruel explica o grande Leônidas da Silva, artilheiro e melhor jogador da Copa de 1938, tenha sido apenas o terceiro colocado no Mundial.

Diamonds are forever.

Diamonds are forever.

O Destino Vil e Cruel, esse fanfarrão, determinou que a geração de Zico, Sócrates e Falcão não levantasse o caneco ao menos uma vez. O DVC, esse dissimulado, ainda nos fez acreditar que o Galinho, ao perder aquele pênalti em 86, era o nosso algoz. Mentira. A culpa é do Destino, esse canalha. Canalha, vil e cruel.

Por outro lado, ora, ora, ora, quem também nos abateu em pleno voo foi o…

4) Destino Sábio e Misericordioso

Sim, ele também sabe o que faz. E acertadamente nos tirou de Copas que não merecíamos, de forma alguma, vencer. Como em 1930, 34, 54, 78 e 90.

Em 30 e 34, as federações cariocas e paulistas brigaram, impedindo craques como Arthur Friedenreich de embarcarem para a Copa. Perdemos logo de cara, bem feito para nós.

Em 54, apanhamos da Hungria na bola e partimos para o pau, em um dos episódios mais tristes das Copas, a Batalha de Berna. Feio, feio…

Para a Copa de 66, foram convocados 47 jogadores (!), entre eles dois Ditões (!!). O certo era o do Corinthians, mas chamaram por engano o do Flamengo. Para não ficar chato, deixaram os dois.  Na Argentina, em 78, Chicão foi convocado, Falcão não. Dá pra ser campeão assim?

Em 90, um time triste, com três zagueiros, três volantes – e ninguém marcando o Maradona. Quis o Destino, de forma sábia e misericordiosa, que não passássemos das oitavas. Não merecíamos mais do que isso. Mais do que o Caniggia argentino, foi a intervenção desse Caniggia onipotente que nos mandou de volta para casa mais cedo.

***

Que Caniggia pode nos derrubar agora? Difícil dizer antes da bola rolar. Os Caniggias são sorrateiros e aparecem de surpresa na área, sem marcação (né, Dunga, Alemão, Mozer, Ricardo Gomes, Mauro Galvão?).

Grandes adversários vão aparecer em nosso caminho. Mas por enquanto, meu maior temor é de um parente do Já-ganhou dos Infernos: o Terrível Não-Pode-Perder-Nem-Ferrando. O medo das consequências de uma derrota (vergonha mundial? Saques? Quebra-quebra?) pode pressionar nosso time a ponto de paralisá-lo.

Toc, toc, toc. Vira essa boca pra lá.

Por ora, importante mesmo é o que o vídeo abaixo comprova: a Copa finalmente chegou no Brasil!

 

Uniformes Inesquecíveis da Humanidade – 4

O cara que surpreendeu novamente o Zagallo.

A seleção da Holanda de 1974 mudou nosso jeito de ver o futebol.

Não só por causa das inovações táticas, do uso da linha de impedimento, do “futebol total”. Disso todos sabem. Mas também porque, graças ao futebol vistoso dos holandeses naquela Copa, até hoje se espera um futebol ofensivo, envolvente, moderno de todo time que joga de laranja.

No entanto, o Uniforme Inesquecível da Humanidade que eu gostaria de destacar aqui não é o flamejante laranjão que os cavalinhos do carrossel vestiram em 1974. É o de apenas um deles. Este aqui, o número 14 de Johan Cruyff:

O grande craque Johan Cr... meu Deus, olha o cabelo do zagueiro!

Ué, mas essa camisa não era igual à dos outros? Não. Repare bem, ela tinha só duas listras nos ombros. As do resto do time tinham três:

Neeskens e Rep: uma, duas, três listras.

Não foi o costureiro que comeu bola. A listra que falta é, na verdade, o ápice de uma rivalidade que começou muito tempo antes e ainda está longe de acabar.

***

Os irmãos Rudolf e Adolf Dassler nasceram na impronunciável cidade alemã de Herzogenaurach.

“Rudi”, o mais velho, era falastrão, explosivo e tinha a manha para vendas. “Adi”, introspectivo e minucioso, era um apaixonado por esportes. Seguindo o ramo do pai, em 1920 ele monta uma sapataria. Mas estava interessado mesmo num negócio totalmente inovador, que juntava suas duas paixões: calçados esportivos.

Em 1924, os manos se juntam e fundam a Gebrüder Dassler Schuhfabrik — ou, com menos consoantes, “Fábrica de Sapatos dos Irmãos Dassler” — dedicada inicialmente a fazer calçados para corrida e chuteiras de futebol.

Os manos Adolf e Rudolf Dassler.

O talento de Adolf para construir pisantes mais leves e flexíveis e o tino comercial de Rudolf fizeram da empresa familiar um sucesso. Cada vez mais atletas usavam os artigos que saíam de Herzogaranourfster.

O incentivo quase obsessivo dos nazistas à pratica esportiva ajudou a bombar a produção da fábrica. Ironicamente, a consagração internacional chegou quando os Dassler conseguiram que Jesse Owens usasse o calçado deles nos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936. O negro americano ganhou quatro medalhas de ouro e deixou o Führer espumando.

Impossible is nothing, Jesse.

As personalidades antagônicas dos irmãos e a luta pelo controle da fábrica sempre causaram brigas homéricas. A Segunda Guerra Mundial levantou a fervura de vez. Os dois tiveram que voltar a morar na mesma casa, e um vivia às turras com o outro.

Durante um bombardeio noturno a Herzougaraiauchfftsrs, Adolf comentou, referindo-se aos aliados: “Lá vêm esses malditos de novo.”. A esposa de Rudolf ouviu e achou que o cunhado falava dela e do marido. Ao fim da guerra, Rudi foi preso pelos americanos, acusado de colaboração com os nazistas. Ele passou a vida inteira jurando que tinha sido o irmão que o havia dedurado.

Nessa altura, não tinha mais jeito: a fábrica tinha que ser dividida. Adolf juntou sílabas do seu apelido e do seu sobrenome e fundou a “Adidas”. Para distinguir seus produtos, meteu três listras em cada um deles.

Rudolf também criou sua empresa, instalada do outro lado de Hierzourchinaurarghtfktls, e usou o mesmo raciocínio para chamá-la de “Ruda”. Depois usou a cabeça e viu que esse nome era feio para dedéu e a renomeou como “Puma”.

A Adidas ganhou destaque na Copa de 1954, quando Adi Dassler colaborou com o Milagre de Berna ao fornecer chuteiras de travas ajustáveis aos jogadores da seleção alemã. Com calçados mais adequados ao campo encharcado da final, eles viraram o jogo contra os favoritíssimos húngaros: 3 a 2.

Os milagreiros campeões mundiais de 1954 e seus pisantes incrementados.

Com o tempo, as duas empresas passaram a fazer bolas, agasalhos e todo tipo de artigo esportivo — além entrar de vez para o guarda-roupas de todos os terráqueos, atletas ou não.

Enquanto a Adidas buscava cooptar todo esportista que via pela frente, a Puma, sem tantos recursos, se concentrava em alguns poucos — mas justamente os que mais chamavam a atenção da mídia, seja por seu talento ou por sua personalidade controversa. Pelos dois critérios, este era o caso de Cruyff.

***

Desde moleque no Ajax, Cruyff logo destacou por seus dribles e arrancadas — mas também pela sua liderança e vaidade.

O meia magrelo transformou um time modesto com estádio acanhado no tricampeão da Europa, sempre jogando com liberdade por todo o gramado, com a anuência do técnico Rinus Michels.

A Puma se aproximou dele rapidinho. Mas não sem passar algumas dores de cabeça. Aos 20 anos, ele já recebia 1.500 florins para usar as chuteiras com a marca do felino. Como forma de conseguir um contrato melhor, passou a usar nos treinos chuteiras Adidas, alegando que as da sua patrocinadora machucavam seus pés.

Apesar de por conta disso ter sido processado pela empresa de Rudolf Dassler, Cruyff acabou ganhando dela, às vésperas da Copa de 1974, um contrato 100 vezes maior.

Consciente do novo papel dos atletas no recém-criado negócio do esporte, ele sempre defendeu que eles deveriam ser muito bem recompensados pelas suas atuações — e, por isso, nunca perdeu a fama de mercenário.

Eu quero minha parte em dinheiro.

***

Para a Copa da Alemanha, a Adidas fechou contrato com a CBF da Holanda. Os jogadores usariam camisas, calções e moletons com as três listras da empresa.

O empresário (e sogro) de Cruyff afirmou aos cartolas laranjas que o craque poderia até dormir com sua filha, mas não usar produtos de outra empresa que não a Puma.

A federação se borrou de medo de perder o principal responsável por levar a Holanda à Copa pela primeira vez desde 1938. A Adidas, de ser responsabilizada pelos torcedores por ele não estar nos gramados alemães. E acabou cedendo.

E assim nasceu o uniforme de duas listras de Cruyff, uma solução salomônica para uma das maiores crises entre os dois irmãos marrentos de Hierzrouchnieszlingaurchiaft.

The brand with two stripes.

Detalhe da camisa paraguaia-holandesa de Cruyff.

Além das listras, havia outra diferença entre o uniforme do meia para o do resto do time: enquanto para todos a numeração seguia a ordem alfabética (o goleiro Jongbloed, por exemplo, era o número 8), ele jogou com o 14, número de sorte dele — dane-se a ordem alfabética, o cara é o dono do time!

***

Cruyff havia se metido em uma ferrenha disputa familiar-empresarial, mas, ao lutar por seus direitos e seus florins, não se deixou transformar em um mero, hã, laranja nessa pendenga.

O que não o impediu de cair numa ”pegadinha” da rival da sua patrocinadora. Conta a jornalista Barbara Smit no excelente “Invasão de Campo”, que quando a Holanda foi tirar a foto oficial para a Copa, um representante da Adidas se misturou com os jogadores e, discretamente, botou uma bolsa da marca bem na frente das chuteiras Puma de Cruyff…

***

Cruyff não foi à Copa seguinte, mas os gêmeos Willy e René van de Kerkhof, patrocinados pela Puma, estavam em campo e, seguindo seu exemplo, também exigiram camisetas com duas listras.

***

Rudolf Dassler morreu em 1974 e Adolf, em 1978. Ambos foram enterrados no mesmo cemitério, em Hierzzougeneregaraurachartsrowlaaaargh. Em lados opostos, claro.

***

Ver também: Uniformes Inesquecíveis da Humanidade 1, 2 e 3.

Postado por: Marcos Abrucio

Uniformes Inesquecíveis da Humanidade – 2

 

O manto do Rei

 

“When you’ve won as many World Cups as Brazil — five — you are allowed to dress in gold.”

É o que diz o jornal inglês Daily Mail, britanicamente jogando com os dois sentidos da palavra “ouro”, ao eleger o uniforme da seleção brasileira como o melhor de todos os tempos.

A camisa canarinho não se dá bem apenas em Copas do Mundo. Ela também coleciona vitórias em eleições desse tipo ­— deixando para trás outras belezinhas como a camisa laranja da Holanda e a branca do Real Madri.

Em 2007, outro jornal inglês, o Times, listou as 50 melhores vestimentas da história do futebol, e o resultado foi o mesmo. Entra vinheta sonora: Brasil-sil-sil!

E isso apesar da combinação amarelo e azul com detalhes verdes não ser das mais perfeitas à primeira vista, segundo os especialistas em moda (hmmm) ingleses.

Mas não foram seus dotes fashion (hmmmmm) que fizeram da amarelinha um ícone, e sim o que ela passou a representar — especialmente após 1970.

Jogador, ator e modelo.

 

O amarelo entrou em campo às vésperas da Copa de 1954, em substituição ao uniforme todo branco — apontado como um dos culpados (!) pela derrota na Copa anterior. Segundo os corneteiros da época, a camisa branca não era “suficientemente nacionalista”.

Com apoio da CBD, a CBF da época, o jornal carioca Correio da Manhã lançou em 1953 um concurso para escolher o modelo a ser usado na Copa. A opção vencedora foi mandada por um gaúcho de Pelotas (ok, chega de piadas) de apenas 19 anos, Aldyr Garcia Schlee, que depois se tornaria um reconhecido jornalista e escritor.

O pai da criança.

 

Com a nova camisa, o Brasil ganhou as Copas de 1958 (apesar de ter usado a reserva azul na final) e 1962. Mas foi depois da Copa de 70 que o amarelo da seleção virou um símbolo com vida própria.

Primeiro, porque foi a primeira Copa transmitida ao vivo, via satélite, para o mundo inteiro. Para muitos países, em cores (no Brasil foi em pb mesmo, ô pobreza). Aí, claro, aquele amarelão se destacou.

Ainda mais naquele time. Nunca uma equipe havia unido tão bem jogo sério com jogo bonito, aplicação tática com talento, eficiência com magia. Depois dessa Copa, ao ver a vestimenta amarela entrando em campo os adversários adquirem a mesma tonalidade, e o público já espera o show.

Ao ver amarelo, atenção.

 

Por último, embora na eleição do Daily Mail o vencedor tenha sido o uniforme brasileiro de “qualquer época”, a camisa de 1970 é certamente a mais feliz que já vestimos.

O modelo simples, sem gueri-gueris, a gola redonda e o tom perfeito do amarelo fazem dela um clássico. O engraçado é que duas empresas fabricaram essa camisa, a Athleta e a Umbro. Os jogadores usavam uma em cada tempo. A diferença entre elas está no formato dos números: os da Athleta eram retos, os da Umbro, arredondados.

Athleta, Umbro.

 

Nos próximos dias, a Nike deve lançar o modelo que os jogadores vão usar na África do Sul — e a gente, em peladas e baladas. Esse é sempre um momento de apreensão: vão deixar a camisa bonita ou vão estragar tudo?

Eu torço para que não inventem. Que seja algo simples, elegante, clássico. Como o fardamento de 70. Esse sim, um legítimo Uniforme Inesquecível da Humanidade.

Ver também: Uniformes Inesquecíveis da Humanidade – 1.

Postado por: Marcos Abrucio

Traumas

Sou só eu ou você também vê algo diferente nesse comercial?

Um cara pede para a seleção ir para a Copa “como quem vai para uma batalha”. Outros exigem “luta” e, em caso de derrota, uma “volta por cima”. Outro avisa: “vamos para a guerra juntos”.

São torcedores do Brasil. Sabe aquele país que sempre se orgulhou do seu “futebol-arte”, berço de craques que jogavam sorrindo e inventavam dribles desmoralizantes? O país onde muitos ainda torcem o nariz para a seleção de 94 porque ela não “ganhou bonito”? Que, aliás, acha que jogar bem é tão importante quanto ganhar? Esse mesmo.

Então o que essas frases estão fazendo na boca da galera? Pode ter certeza que não estão lá à toa. Antes de ligar a câmera para fazer um comercial, infinitas pesquisas são feitas, refeitas e refeitas. Esses gritos de guerra só foram parar no roteiro porque refletem o sentimento do torcedor brasileiro hoje. É fato. Mas o que aconteceu para, no lugar de “artistas”, querermos “guerreiros”?

Fácil: a Copa de 2006, maldita seja.

A Copa a que chegamos como favoritos e da qual saímos com o rabo (e a bola) entre as pernas. Aquela seleção será sempre lembrada como apática, preguiçosa, mascarada, sem gana. É verdade que as expectativas eram muito altas, mas é verdade também que foram muitos os nossos erros. Dos dirigentes, do técnico e dos jogadores. Mas isso é assunto para outro post, ou, pensando bem, melhor não.

2006: falta de Gana

O que eu quero dizer é que o estado de espírito do torcedor brasileiro para a próxima Copa é resultado da catatonia brasileira na Copa anterior. E que esse tipo de trauma é comum, pelo menos nessas bandas.

Em 1950, perdemos a Copa em casa, de virada, podendo empatar e levando um gol Chico Xavier faltando 10 minutos para acabar o jogo. Dureza. Primeiro, o pais inteiro ficou mudo. Depois, soltou os cachorros para todos os lados. Sobrou até para a camisa branca da seleção. Teria dado azar, a desgracenta.

Camisa branca: sai, zica.

Mas quem sofreu mesmo foram os jogadores. Em especial, olha só a merda, os negros e mulatos, como Barbosa, Juvenal e Bigode. Para a massa, faltaram a esses jogadores a raça e hombridade que sobravam nos uruguaios. Nem repararam que o capitão e fodão uruguaio Obdulio Varela também era mulato.

Na Copa seguinte, agora de amarelo, a seleção tratou de mostrar todo o seu apetite. O resultado foi uma das maiores vergonhas da história das Copas: a Batalha de Berna.

Antes do jogo contra a Hungria, os dirigentes brasileiros passaram a noite enchendo a cabeça dos jogadores. Exaltados, os cartolas exigiram honra, patriotismo e até que os jogadores vingassem as mortes dos soldados brasileiros na Segunda Guerra Mundial. O que os húngaros tinham a ver com isso, não se sabe.

Os brasileiros entraram em campo pilhados, cheios de fibra. E com 10 minutos, já estava 2 a 0 para a Hungria. No fim, 4 a 2 para os húngaros, Nilton Santos e Humberto expulsos e um baita quebra-pau depois do apito do juiz. Jogadores, cartolas e jornalistas saíram na mão com os adversários, policiais e quem mais aparecesse na frente. Foi feio.

Batalha de Berna: fibra demais dá a maior merda

Outro trauma, enorme, foi o de 82. Para muitos, aquela seleção caiu por só querer atacar. Contra a Itália, “não soubemos jogar pelo empate”. Bem, na Copa seguinte fomos eliminados pela França justamente com um… empate. Os três zagueiros da seleção de Lazaroni em 90 também são filhos diretos das feridas causadas pelas derrotas das seleções “ofensivas” na década anterior.

Aí chegou a Copa de 94, que ganhamos com muito vigor, aplicação defensiva e um sonoro 0 x 0 na final. O grito desentalou da garganta. Finalmente éramos campeões, e agora poderíamos nos soltar (opa), desencanar dos medinhos e nos dedicarmos ao espetáculo, à arte, à diversão, ê, laiá.

É o que vemos no comercial que passava às vésperas da Copa seguinte — repare que o espírito daquela época era exatamente o contrário do de hoje: os jogadores querem se divertir, dar espetáculo (e, no fim, perdem o gol…):

Depois de 2002, com mais uma estrela no peito, esse discurso voltou: a ordem era jogar bonito, com muita alegria e malemolência:

Só que na Alemanha faltou jogar bonito, faltou alegria, faltou malemolência. Faltou ganharmos. E o diagnóstico final: faltou raça.

Mas peraí: no fim, o que nos derrubou não foi a falta de garra, e sim o excesso de talento — só que do outro lado, sob a camisa 10 do adversário.

Clap, clap, clap.

Para conseguirmos superar todos os nossos traumas em 2010, o que eu desejo mesmo é que joguemos tanto quanto esse cara. Na raça e na bola.

Postado por Marcos Abrucio.